Há a imagem-poética da infância
[...] Minha tia e sua máquina de escrever. Ela usa óculos. Está concentrada. E escreve... Deixando correr pela casa, entre canos e cimento, tijolos, parede e fundamentos, e também na poeira tão velha que descansa lá nos quartos lá de baixo, e nas dobradiças espelhadas à superfície das portas, e – sobretudo – no meu coração encostado no chão enquanto eu brincava, e por todo o casario vermelho porque sol... o ressoar do timbre pesado-leve dos acordes-letras. Eu criança parava. Imaginava... Que palavras partejava ela e a máquina? Que vida nascia? Pouco a pouco amando mais a palavra. Enxergando o seu milagre. E minha tia, num repicar sereno de letras, números e símbolos cifrados no silêncio barulhento da máquina-incrível... devia estar a fazer algo do seu trabalho para a escola. Não sabia que afagava com leveza sonhos futuros. Não sabia que, na inesgotável paisagem do tempo, tornava-se poema.